O Natal de Janaína

Pessoal,

Sério que já chegou outro Natal? Caramba, esse ano voou. Agradeço a todos os leitores que continuam sempre vindo e as pessoas novas, que chegaram recentemente nesse cantinho e me deixam muito feliz. O conto que deixo abaixo é o do ano passado, mas é um presente para todos que chegaram há pouco tempo e ainda não o leram. Espero que gostem. Nos próximos dias estarei com a família, mas sempre que puder, passarei por aqui. Lembrem-se que o fato de estarem vivos e com saúde já é mais do que motivo suficiente para agradecer ao Papai Noel. Ele não existe? Tem certeza? E se for todo o sentimento bom do mundo? O carinho, a amizade, a caridade? E se o bom velhinho for os votos de felicidade, a alegria, o desejo de fazer um ano próximo melhor? Então ele existe, sim. E não vamos deixá-lo morrer.

Um Feliz Natal a todos!

O Natal de Janaína

Eu preciso comprar um presente para a filha do meu namorado. Aquela menininha mimada que, no último Natal, chamou a boneca que eu comprei de ridícula e enfiou o presente dentro da privada. É claro que eu, doce como um marmelo, acolhi a pequenina nos meus braços e disse que tudo ficaria bem, que depois compraríamos outra boneca, mesmo sabendo que ela não queria. Uma menina de nove aninhos já sabe o que diz e é pra ela que eu preciso escolher um presente de Natal, porque o Beto não quis vir para o shopping comigo. Droga, e agora, o que eu vou dar pra ela?

Uau! Promoção compre-um-leve-dois naquela loja bacanérrima. Se eu levar um vestidinho pra molequinha, eu posso ganhar um presente pra mim. Nossa, mas esse shopping está um inferno. Também, por que eu escolhi vir aqui justo na véspera de Natal? Todo mundo teve a mesma idéia? Preciso comprar o presente da enteada, do Beto, da minha tia que teve neném, do pai e da mãe – lembrando que eu terei que passar na casa do pai às dez, da mãe às dez e meia, da tia às onze, da vó do Beto às onze e meia e torcer para que antes da meia-noite eu esteja longe de lá.

Shopping lotado, meu salto quebra. Sem tempo para pensar no que fazer, eu arranco a pontinha quebrada, guardo na bolsa para colar depois, entro na primeira loja que encontro e compro um par de sandálias de dedo bem lindonas cor-de-laranja. Tudo bem que estou de terninho verde, mas era a única do meu número. O importante agora é comprar os presentes. Mas por que mesmo o Beto não quis vir? Ele nunca quer vir a lugar nenhum comigo. Chato.

Comprei os presentes e ainda tenho tempo para fazer uma escova, as mãos, os pés e voltar lindona pra casa, a tempo de colocar um vestido para começar a maratona do Natal. Coisa boa essa vida, eu pareço uma maloqueira que enfiou o pé numa mexerica e meu cabelo oleoso já grudou na testa. Mas é hora de ir embora, ir embora, ir embora, até que… opa, é o Beto. É o Beto, eu sei que é o Beto, o que ele faz aqui? Ai, será que veio comprar meu presente? Que legal, que legal, o que será que eu vou ganhar? Mas, opa, quem é aquela mulher com ele? E eles… tão beijando na boca?

Legal. Gastei todo o meu décimo terceiro salário com presentes para um namorado que passeia com a amante no shopping bem na véspera de Natal. Deve ser uma vagabunda. Mentira, ela parecia uma princesa. Droga, uma mulher bonita ainda por cima, toda chique, vestida de marca dos pés à cabeça. E eu quebrei o salto, estou com roupa de trabalho, cabelo sujo, lotada de sacolas. Merda de vida. Justo hoje que eu estava tão aberta com espírito natalino para aceitar a filha dele. Justo hoje ele me apronta uma dessas. Vai ter que devolver cada centavo que eu gastei.

Vaguei pelo shopping. E agora, o que eu faço? Eu posso deixar os presentes na casa dele, com um recado ameaçador, do tipo “eu sei o que você fez com sua namorada, pague uma grana que eu calo a boca”, assim resgato o que gastei, ou posso chegar no meio da festinha de Natal e surtar, dizer um monte de coisas que sempre quis dizer à família dele, ou ainda…

- Ho ho ho

Era só o que me faltava. O Papai Noel.

- Ho ho ho, minha filha!
- Pô, Papai Noel, hoje não é um bom dia.
- Mas é Natal. Coloque um sorriso no rosto!
- Dá pro senhor ir pro outro lado? Pra lá? Mais pra lá? Vai, assim, tchau…
- Uma moça tão bonita assim mal humorada?
- Olha, eu tô bem humorada, se considerarmos o que aconteceu.
- Desabafa com o Papai Noel.
- Fumou maconha, Papai Noel?
- Abra seu coração.
- Já abri a carteira, que foi mais difícil. E um espaço na cabeça para os galhos. Posso até ser uma de suas renas, bom velhinho.
- Opa, menina, calma, calma… Quer um presentinho?
- Vai ser o primeiro que vou ganhar.
- Se conseguir adivinhar o que eu tenho na minha mão, leva um beijo nesse bocão.
- Papai Noel!!!
- Ahááá. Te peguei.

Não acredito que eu desabafei com ele. Quando o Murilo tirou a barba, eu já percebi que era ele. Ainda com gorrinho e cabelo branco, saco vermelho nas costas, barriga de mentira, óculos de metal, eu sabia que era ele. E o danado me enganou. Meu ex-namorado.

- Seu crápula.
- Que recepção nada calorosa, Jana.
- Você não é o Papai Noel!
- Claro que não. Ele não existe, não te contaram?
- Mas é que… eu te disse…
- Da galhada? Esquenta, não, se foi aquele mané do Betão, ele bem que não te merecia. Você precisa de algo bem melhor.
- Valeu.
- Tipo o Papai Noel – ele disse, com uma piscadinha.
- Tô indo.
- De quem são esses presentes?
- Eram. Não são mais. Só tem um vestidinho que ganhei na promoção porque comprei outro, mas o resto não tem dono.
- Tenho uma idéia. Você topa?
- Primeiro conta pra ver se eu topo, né.

E então naquele Natal eu não fiz nada do que havia programado. Não estive na casa do pai às dez, da mãe às dez e meia, da tia às onze, da vó do Beto às onze e meia e nem tive que torcer para sair cedo de lá. Não fiz escova, mão, pé, nem tomei banho. Saí do shopping direto para uma festa de crianças em um orfanato, que ganharam alguns presentes lindos e novinhos. Depois ainda fomos a um asilo, onde ficaram os outros presentes. Murilo tinha muito mais no carro, a minha contribuição foi bem pequena. Mas eu senti a alegria de estar ao lado dele e ver cada sorriso que recebia. Eu fui a assistente do Papai Noel mais bacana que eu já conheci, que ganhava no shopping, e gastava em presente para quem precisava.

- Obrigada, duende. Você é ótima ajudante.
- Também, com um Papai Noel como você…

Silêncio.

- Murilo, dá pra tirar a barba antes de me beijar?
- Opa, esqueci!

E eu me senti linda, amada, querida, tão feliz que nunca pensei que Natal pudesse ser tão legal. E continua sendo, todos os anos.

Feliz Natal!
Alegrias,
Fernanda.

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Uma resposta to “O Natal de Janaína”

  1. Flavia Fraga Says:

    Muito legal a historinha. Escroto esse Beto, hein?
    Bjss

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